- Luis Cavalcante
- 31 de dez. de 2022
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No século IV a.C., em Siracusa, na Sicília, existiam dois amigos inseparáveis, Pítias e Damon. Nada havia que um não fizesse pelo outro.
Certo dia, o rei de Siracusa, Dionísio, aborreceu-se ao tomar conhecimento de certos discursos que Pítias vinha fazendo.
O jovem pensador andava dizendo ao público, que nenhum homem devia ter poder ilimitado sobre outro. E que os tiranos absolutos eram reis injustos. Presos - ambos os amigos - Pítias reafirmou perante a autoridade real as suas idéias.
O que dizia ao povo era a verdade e, portanto a sustentaria, custasse o que custasse. Acusado de traição, Pítias foi condenado à morte. Como seu último desejo, pediu ao rei que o deixasse dizer adeus à sua mulher e filhos, além de colocar os assuntos domésticos em ordem. Dionísio riu do desejo do condenado: – Vejo que além de injusto e tirano, você também me considera um tolo. Se sair de Siracusa, tenho certeza que nunca mais voltará, disse o rei. Foi nesse momento, que Damon adiantou-se e ofereceu-se como garantia. Ficaria em Siracusa como prisioneiro, até o retorno do amigo. – Pode ter a certeza de que Pítias voltará. Nossa amizade é muito conhecida. Eu ficarei aqui. Ainda desconfiado, Dionísio examinou os amigos, alertando Damon que, se Pítias não voltasse, ele morreria em seu lugar, e aceitou a oferta. Pítias partiu e Damon foi atirado na prisão. Muitos dias se passaram. Pítias não voltava e o rei foi verificar como estava o ânimo do prisioneiro. Estaria arrependido de ter feito o acordo? – Seu tempo está chegando ao fim, sentenciou o rei de Siracusa. Será inútil implorar misericórdia. Você foi um tolo em confiar em seu amigo.
Achou mesmo que ele voltaria para morrer?
Com firmeza, Damon respondeu: – É um mero atraso. Talvez, os ventos não lhe tenham permitido navegar. Talvez, teve um imprevisto na estrada. Guardo a certeza que, se for humanamente possível, ele chegará a tempo.
Dionísio admirou-se da confiança do prisioneiro. Chegou o dia fatal. Damon foi retirado da prisão e levado à presença do carrasco. Lá estava o rei, sarcástico, gozando sua vitória. – Parece que o seu amigo não apareceu.
O que você acha dele agora? Perguntou. – É meu amigo. Confio nele, foi a resposta de Damon. Nem terminara de falar e as portas se abriram, deixando entrar Pítias cambaleante. Estava pálido, ferido e a exaustão lhe tirava o fôlego. Atirou-se nos braços do amigo. – Graças aos céus, você está vivo! - falou soluçando. Parece que tudo conspirava contra nós. Meu navio naufragou numa tempestade. Depois, bandidos me atacaram na estrada. Recusei-me, contudo, a perder minha esperança e aqui estou.
Pronto para cumprir a sentença de morte.
Dionísio ouviu com grande espanto aquelas palavras. Era impossível resistir ao poder de tal lealdade. Emocionado, declarou: – A sentença está revogada. Jamais acreditei que pudessem existir tamanha fé e lealdade na amizade.
Vocês mostraram que eu estava errado. É justo que ganhem a liberdade. Em troca, porém, peço um grande auxílio. – Que auxílio?
Perguntaram os amigos. – Ensinem-me a ter parte em tão sólida amizade.
“Não é possível ser bom pela metade.”
Leon Tolstoi